Duas decisões do STF

Duas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) repercutem no mercado de trabalho. Refiro-me ao julgamento em que prevaleceu a tese da supremacia do negociado sobre o legislado e, dias depois, à decisão sobre a necessidade de comunicação prévia do empregador ao sindicato, nas dispensas coletivas.
Quanto à prevalência do negociado sobre o legislado, não podemos ignorar que já na década de 1970 a Justiça do Trabalho adotava jurisprudência construtiva. No vazio da lei, julgamentos em dissídios coletivos de natureza econômica passaram a apresentar soluções inovadoras. Analisem-se, nesse sentido, os Precedentes Normativos do Tribunal Superior do Trabalho (TST). São dessa época a estabilidade da gestante, incorporada à Constituição de 1988, e o “salário do substituto”.
O julgado do STF confere segurança jurídica a acordos e convenções coletivas contestados pelo Ministério Público do Trabalho, às vezes pelo próprio sindicato signatário do documento e, frequentemente, por trabalhadores beneficiados pela norma coletiva, como aconteceu em Programas de Demissões Voluntárias.
A segunda determina a necessidade de prévia informação, por parte da empresa ao sindicato, nas demissões coletivas. O acórdão não está publicado, mas já se faz conhecer nas linhas gerais, graças a comentários de juristas.
De todo modo, permito-me colocar duas questões. A primeira é quanto ao alcance da comunicação. Seria para apenas para dar conhecimento, ou pretende ir a fundo e impedir desligamentos? A segunda diz respeito à expressão coletivo. Para o Dicionário Houaiss, coletivo significa “que abrange, pertence ou é utilizado por muitos” e “conjunto de seres ou de coisas da mesma espécie consideradas como um todo”. Na esfera do dissídio coletivo (CLT, Título X, Capítulo IV), o termo recebe o segundo significado. Não se aplica a alguns ou dezenas de empregados identificados, mas ao conjunto abstrato e não individualizado de integrantes da categoria profissional ou econômica.
A Constituição e a CLT possuem regras claras sobre demissões. O art. 7º, I, da Lei Fundamental dispõe sobre a “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”. O inciso seguinte garante ao trabalhador “seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário”, e o terceiro cuida “do fundo de garantia do tempo de serviço”.
O art. 10, I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), ordena: “Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição”, a proteção ao demitido sem justa causa ou arbitrariamente, corresponda à importância “igual a quarenta por cento de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros” (Art. 18 da Lei nº 8.036/1990, com a redação dada pela Lei nº 9.491/1997).
O art. 477 da CLT trata de indenização paga na base da maior remuneração percebida na mesma empresa, ao assalariado “quando não haja ele dado motivo para a cessação da relação de emprego”. O dispositivo foi neutralizado por incompatibilidade com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que, também, colocou em desuso o capítulo relativo à estabilidade. O art. 477-A, introduzido pela Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), dispensa autorização prévia de entidade sindical para dispensas individuais, plúrimas ou coletivas. Os artigos 487/491 disciplinam o aviso prévio pago ou indenizado, dado pelo empregador em dispensas sem justo motivo.
É cedo para tirarmos conclusões a propósito das decisões do STF. Em relação à segunda, creio, porém, que o gerente de recursos humanos não deixará de notificar o sindicato, na hipótese de a empresa se encontrar frente à necessidade de demitir empregados para encerrar linha de produção obsoleta; mudar o estabelecimento para outra cidade, estado ou país; finalizar o negócio por razões de família ou perda de interesse econômico. É coletivização do aviso prévio individual instituída discricionariamente pelo Supremo.
Bastará à empresa informar o sindicato e lhe fixar prazo razoável para sugerir alguma solução, desde que possível do ponto de vista empresarial. Impugnar medida administrativa interna, disciplinada pela Constituição e CLT, o sindicato não me parece autorizado a fazer. Afinal, recaem sobre o empregador os riscos do negócio, como a insolvência e a falência.
É triste. Quer, porém, no capitalismo, socialismo, comunismo, anarquismo, vacina contra a desigualdade, a pobreza, o desemprego, ainda não foi descoberta.