Súmula 331-TST: o enigma

Em 1986, quando aprovaram a Súmula 256, condenando a terceirização à ilegalidade, os ilustres Ministros integrantes do Tribunal Superior do Trabalho (TST), não previram as consequências desastrosas da súbita e injurídica decisão.
Dava passos iniciais o processo de descentralização no setor industrial, mediante a contratação de companhias prestadoras de serviços para execução de tarefas como limpeza e conservação.
As primeiras empresas do gênero foram precariamente organizadas, do que resultaram numerosas reclamações trabalhistas ajuizadas por trabalhadores braçais de reduzida qualificação que se sentiam lesados.
Compunham o TST os Ministros Coqueijo Costa, Marcelo Pimentel, Barata Silva, Nelson Tapajós, Prates de Macedo, Guimarães Falcão, Marco Aurélio Mello (posteriormente nomeado para compor o Supremo Tribunal Federal), Ildélio Martins, João Wagner, Orlando Teixeira da Costa, Mendes Cavaleiro, Norberto Silveira de Sousa. À nova súmula foi dada a seguinte redação: “Salvo os casos previstos nas leis nºs 6.019, de 3/1/1974 e 7.102, de 20/6/83, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços”.
Passados 2 anos, foi promulgada a Constituição de 1988, cujo art. 37, II, determinou a obrigatoriedade de concurso público para preenchimento de empregos em empresas estatais e sociedades de economia mista.
O resultado consistiu na amputação da parte final da Súmula 256. Desse dia em diante, a Justiça do Trabalho ficou impedida de transpor vínculo empregatício da prestadora para a tomadora de serviços quando se tratasse de estatal, caso da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, ou de sociedade de economia mista, como a Petrobrás.
Compelido a rever sua posição o TST se revelou dividido: ministros de formação conservadora insistiam em se opor à realidade; outros, de visão aberta ao mundo, perceberam que estavam diante de fenômeno irreversível da economia, e que a Súmula 256 se achava ultrapassada.
Após cerca de duas horas de discussão, as correntes divergentes chegaram ao acordo possível, com a aprovação de súmula que recebeu o número 331.
Foi aceita a terceirização dos serviços de limpeza e conservação, indispensável no serviço público e na esfera privada; instituída a responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços, relativa a dívidas trabalhistas da prestadora de serviços; e fixada a atividade-meio, como limite à contratação de serviços de terceiros, continuando vedada, a contrário senso, terceirização de atividade-fim.
Participaram da sessão os Ministros Orlando Teixeira da Costa, presidente, José Ajuricaba, Ermes Pedro Pedrassani, Marcelo Pimentel, Guimarães Falcão, Wagner Pimenta, Almir Pazzianotto Pinto, Galba Velloso, Hylo Gurgel, José Calixto, Ursulino Santos, José Luiz Vasconcellos, Ney Doyle, Francisco Fausto, Cnéa Moreira, João Tezza.
Como solução de emergência, o TST avançou, mas, inadvertidamente, gerou caudalosa fonte de novos conflitos.
Como traçar linha divisória nítida e objetiva entre atividades meio e fim? Suscitado em milhares de reclamações trabalhistas e ações civis públicas, o enigma permanece no ar, provocando ambiente de insegurança jurídica para milhares de empregadores, sobretudo de médio e grande porte.
Ao tratar do direito de empresa, o Código Civil define sociedade como contrato celebrado por pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados (art. 981).
Diversas são as formas de sociedades, todas, porém, organizadas com o propósito único de produzir e partilhar lucros. Em lugar algum do Livro II, que disciplina o Direito de Empresa, encontramos as expressões atividade-meio e atividade-
fim. O velho e notável Código Comercial também não as reconhece.
Como signatário da Súmula 331, penso que o TST se equivocou. Em vez de pôr fim ao problema apenas o postergou, para gerar prejuízos de centenas de milhões e colaborar para o desemprego.
Creditava-se à jurisprudência a tarefa de traçar distinção entre coisas indistinguíveis e entrelaçadas dentro da empresa, o que, como revelam os fatos, não aconteceu.
Cabe ao Supremo Tribunal Federal pôr termo ao enigma e o fará com breve declaração de que a divisão da atividade empresarial em fim e meio, como posto na Súmula nº 331, não existe em lei. Simples assim, mas a beleza, como escreveu Olavo Bilac, está na simplicidade.

(Correio Braziliense, 2/12/2016, pág. 11).