A voz profética de Rodrigues de Abreu

Vive hoje, a Síria, um dos momentos mais tristes da humanidade. Assolada pela sangrenta guerra, cidades inteiras desfiguradas, levas e mais levas de cidadãos tolhidos em seus lares atingidos por bombas, amargurados, perseguidos, massacrados e tudo o mais, nos deixam estarrecidos ante ao poderia bélico de uma catástrofe generalizada. É algo indescritível que o homem produz de nefasto contra humanos indefesos.
Muitos sírios se deslocam para o mundo e são incompreendidos muitas vezes e, no total, são os pequenos que sofrem tanto, sem saberem seus destinos, deixando para trás a sua história tão longa, o seu passado e as suas moradias tão cantadas em versos e prosa.
Um povo sofrido, que se comprimem em sofrimentos imagináveis e buscam o apoio internacional para as suas chagas: alimentos e acolhimentos
Outrora, Capivari possuía uma associação Sírio-Libanês de fazer inveja, pela unidade, pelo engrandecimento da história de nossa cidade e pela disposição em contribuir com a nossa cultura, comércio e indústria¸ além da refinada educação. Foi um tempo áureo, com a participação ativa destes que deixaram o seu país em busca do Brasil. As notícias das décadas de 20, 30 e 40 são recheadas de acontecimentos e envolvimento de sírios na grandeza da “Terra dos Poetas”.
Mas isto foi em idos tempos. Foi bem em décadas passadas e, se buscarmos os jornais e os documentos do passado, notaremos o quanto os sírios produziram para Capivari na sua grandeza de cidade benquista.
Não enxergamos, infelizmente, uma recomposição; um momento de trégua e uma reunificação, principalmente dos valores humanos. Parece-nos que a incompreensão se enraizou de tal forma que, a entender dos estudiosos, percorrerá ainda longo tempo.
Cidades, como Damasco e Alepo – de tantos centenários, vivem o amargor do dia-a-dia, sem saber até que ponto chegará, já que as ruinas tomam conta de tudo e tombam monumentos, casas e a história sagrada do povo, além das mortes avassaladoras.
Mas, aqui, como profética criação poética e antevendo tudo isso, o nosso poeta maior, Rodrigues de Abreu, escrevia, há 100 anos, um soneto que sintetiza todo esse amargor. Para a imaginação de todos, aqui o reproduzimos “SÍRIA”, publicado no jornal “O Município”, edição de 14 de julho de 1918.

Sob um céu que é de luz e é feito de ouro e opala,
a Síria a contorcer-se, em angústia infinita –
vem do imenso deserto uma imensa desdita.
que a punge, e o próprio mar os seus flancos abala!

E a alma das coisas, livre, ao ar sobe! Trescala
o amor da Liberdade as montanhas… E a aflita
triste Síria vasqueja, e, soturna medita
tudo o que tudo, em torno, em segredo, lhe fala.

Numa dor que semelha o soluçar de um mundo,
o Líbano não mais ergue os cedros à altura!
As mesquitas, em ruina, a cair! E no fundo

o deserto do Egito!… O mar Morto dá asco…
E a clamar pelo fim de tamanha tortura,
bracejam no ar pesado as torres de Damasco!…