TECELÃS TEJEDORAS

De quando em vez, se nos deparamos com verdadeiras joias da literatura brasileira. São obras, não do pretérito, mas do presente, com inovações que nos surpreendem e nos deixam admirados pela sua concepção.
Nestes dias, recebemos um exemplar do livro “Tecelãs – Tejedoras”, de autoria da poeta potiguara Rizolete Fernandes e pudemos constatar, já de chofre, o grande valor de uma obra feita com rígida observação biográfica das 20 mulheres representativas que compõem a referida edição bilíngue (português-espanhol). Esta versão para o espanhol é da escritora salmantina Jacqueline Alencar, autora do prefácio, e a orelha competiu às penas da Professora Conceição Flores, da Universidade Potiguar – UNP.
Confessamos, realmente, que jamais tínhamos visto, em edição nacional, uma obra que relatasse a vida de cada figura exponencial em versos. E foi o que a Rizolete Fernandes fez, com uma maestria digna dos mais elevados elogios, não só pela cadência da cronologia-vida de cada qual, mas pelo sabor do conhecimento com que a autora compôs os passos das 20 mulheres.
O que nos surpreende, sobremaneira, é a riqueza de detalhes, o conhecimento da folha-corrida das homenageadas e a verve que, de maneira enraizada, está nas veias da escritora.
Há dias, estávamos observando comentários de estudiosos da música brasileira falando de quando do aparecimento de Belchior. Foi uma tremenda discussão em torno de músicas compostas em versos livres, sem muita cadência, mas inovadoras no sentido de provocar a crítica, sempre áspera quando se produz algo diferenciado. E lembramos, aqui, do programa da TV Cultura, com o Prof. Pasquale Cipro Neto, (Nossa Língua Portuguesa), no qual ele entrevistando Belchior, contou da primeira apresentação do cantor na USP, estando presente apenas três pessoas para vê-lo e ouvi-lo. Foi o início de carreira do célebre compositor que há pouco nos deixou.
Passado mais alguns dias, estávamos nos deliciando com o programa Silvio Brito em Família e este compositor e cantor, desde a Velha Guarda, fez rasgados elogios a um músico que se apresentou com algumas composições de estilo não comum, entre tons baixos e altos e voz canora. Algo também inovador e que recebeu, do Silvio Brito todo incentivo possível para continuar com este seu jeito de cantar e apresentar as suas composições.
E, ainda, lembramos do Bolero de Ravel, cuja composição de Mauríce Ravel, foi apresentada por ele em 1928. A obra musical é composta de um único movimento e provocou, na época, verdadeiro escândalo. Estava, a música, fadada ao insucesso e ao total esquecimento. Mas era uma peça inovadora e, como tal, tornou-se uma primorosa composição, executada até hoje em todos os recantos do mundo.
Com efeito, queremos dizer que a obra da Rizolete Fernandes nos agrada muito e, cremos sinceramente, que a crítica estará ao seu lado, pois que necessitamos, nestes tempos, de inovações, para poder continuar a pregação do novo. Não que o velho seja colocado no bau, mas dando caminhos e aberturas aos trabalhos de ineditismo, como soi apresentar Tecelãs – Tejedoras.
O olho clínico da autora contemplou as significativas 20 mulheres, dentro do panorama de sua visão. É claro que esta seleção advém do seu conteúdo de relevância e de luta em prol do próximo e da prevalência do conhecimento humano: Safo, Christine de Pisan, Teresa d´Avila, Teresa Margarida, Nisia Floresta, Maria Firmina dos Reis, Emily Dickinson, Chiquinha Gonzaga, Auta de Souza, Magdalena Antunes, Gabriela Mistral, Cora Coralina, Laura Brandão, Bertha Luz, Cecília Meirelles, Nise da Silveira, Frida Kahlo, Simone de Beauvoir, Maria Sylvia e Dona Militana – todas descritas com especial cuidado, como bem disse a Professora Conceição Flores, na orelha da obra: “Rizolete Fernandes revela a sua sensibilidade de poetisa e a de pesquisadora cuidadosa para criar uma sororidade, um pacto entre todas as vozes convocadas e o leitor. Um livro imperdível, escrito em versos cuidadosamente construídos, com uma dicção feminina, que foge do lugar comum”.
Numa longa introdução (11 páginas), bem ao feitio das obras portuguesas, Jacqueline Alencar nos dá uma panorâmica do que é a obra e o que realmente ela encerra de personalidades batalhadoras que se notabilizaram pelas suas posições, principalmente as sociais.
“Abrir o livro Tecelãs, de Rizolete Fernandes, é como reencontrar-se com um desses poemas épicos de Homero ou de Virgílio, que em forma de corpo em versos nos relatam as mais insólitas histórias, aquelas que informam das epopeias de muitas mulheres desde os mais remotos tempos da história humana, com suas realizações e avatares sucedidos no percurso de seus dias. Neste século XXI em que vivemos uma era cibernética sem precedentes, onde os meios de comunicação nos impedem de estar à margem de qualquer notícia temos que persistir, continuar falando e escrevendo sobre a desigual paridade entre homens e mulheres. E não é que já não tenhamos alcançado certo êxito, como confirmam algumas estatísticas de organizações confiáveis, entre elas as Nações Unidas. Ainda assim, esta obra emergente sobre mulheres nos alerta que é prioritário continuar trabalhando por essa causa… Em nome dessas vinte tecelãs, digo: Obrigada, Rizolete Fernandes, poeta do Nordeste que se indigna e protesta ante a injustiça!”.
A obra será lançada no dia 17 de agosto próximo, na Academia Norte-rio-grandense de Letras, em Natal, RN. Devemos dizer do nosso contentamento, por recebê-la antecipadamente, numa cortesia toda especial da autora. E sem que ela soubesse, traçamos estas despretensiosas linhas.
“Tecelãs” – composta pela Editora Sarau das Letras Ltda., de Mossoró, RN, neste 2017, com 287 páginas. No final do livro, há uma sucinta biografia da autora, que diz: “Rizolete Fernandes é norte-rio-grandense de Caraúbas e mora em Natal, Nordeste do Brasil. Tem formação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e trabalhou no serviço público estadual. Foi militante de entidades classistas e feministas até o início dos anos 2000. Escreve poesia e crônica que publica em revistas, jornais e blogs, além de ser sócia da União Brasileira de Escritores – RN e do Instituto Cultural do Oeste Potiguar (ICOP) sediado em Mossoró-RN. Publicou os livros A história oficial omite, eu conto: mulheres em luta no RN (Edufrn, 2004); Luas Nuas e Canções de Abril (Uma, 2006 e 2010), poesia; Cotidianas (Sarau das Letras, 2012), crônicas e Vento da tarde/Viento de la tarde (Sarau das Letras/Trilce Ediciones, 2013), poesias. Endereço eletrônico: marrizolete@gmail.com”.
Tecelãs é obra de se ler, reler e meditar sobre as figuras homenageadas em versos pela competentíssima escritora.