Dívidas trabalhistas e precatórios

Carta precatória é a requisição enviada pelo juiz de execução de sentença condenatória transitada em julgado, ao presidente do correspondente Tribunal, a fim de que seja expedida, ao órgão público executado, ordem de pagamento ao credor.
Dito assim aparenta ser simples. Indague-se, porém, ao credor de precatório e ele denunciará a inutilidade da requisição e o interminável tempo consumido para satisfação da dívida.
Devo, não nego, mas pago quando quiser ou puder, é a regra da Administração Pública diante de cobranças judiciais.
O particular executado, que deixa de pagar dentro do reduzido prazo legal, sujeita-se à penhora eletrônica e à execução forçada. O administrador público, não. Protege-se com o precatório e pagará um dia, de acordo com a sua conveniência.
A matéria é regulada pelo artigo 100 da Constituição. O texto original continha, além da parte inicial conhecida como caput, dois parágrafos. Incessantes reclamações contra a demora de pagamento levaram o Poder Legislativo a emendá-lo e lhe acrescentar dezoito parágrafos, dos quais três julgados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
“Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave, ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitidos o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório”, determina o confuso parágrafo 2º da norma constitucional.
Acautelou-se o legislador e incluiu os sucessores entre os credores de débitos de natureza alimentícia, por saber que a dívida frequentemente será paga após a morte do vencedor da ação.
Há poucos dias recebi de velho jornalista aposentado, quase octogenário, correspondência em que escreveu: “Eu não gostaria de morrer ser receber esse meu precatório. Afinal, são quase 20 anos…”
O signatário refere-se à Reclamação Trabalhista ajuizada em julho de 1998 em uma das Varas do Trabalho de São Paulo contra o Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo – IPEM, cuja sentença teve a execução iniciada em 2015.
O IPEM foi criado em 1967 e transformado em autarquia estadual, vinculada à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania em 1995.
Prescreve a Constituição, no Art. 5º, LXXVIII, que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. A garantia não compreende apenas a obtenção da sentença definitiva, mas, também, a liquidação mediante o pagamento da dívida corrigida, seja o devedor pessoa jurídica de direito privado ou pessoa jurídica de direito público.
A Justiça e a Defesa da Cidadania compreendem o pagamento de dívidas contraídas pela administração direta e indireta do Estado com os cidadãos. O caso do idoso jornalista é mais um triste exemplo de desrespeito às garantias constitucionais por parte do Estado.