“Brasil Terra de Contrastes”

No período compreendido entre 20 e 26 de novembro, vivi três distintas e rápidas experiências: retornei à Belém a trabalho; fui à Brasília participar das comemorações do 75º aniversário da Justiça do Trabalho e 70º ano da instalação do Tribunal Superior do Trabalho; percorri centenas de metros no interior da favela localizada nas imediações do Estádio do Morumbi e do Palácio dos Bandeirantes. Mais uma vez observei contrates entre chocantes entre riqueza e pobreza, com bairros ajardinados cercados de extensas áreas de miséria.
Conheço São Paulo há muitos anos. Ou melhor, pensava conhecê-lo. Ao ingressar inadvertidamente na favela constatei meu nível de ignorância. Resido na Zona Sul desde 1970. Brooklin, Campo Belo, Jabaquara, Santo Amaro, Aeroporto, são bairros familiares, onde proliferam favelas, como a do “Piolho”, “Alba”, “Águas Espraiadas”. Nunca, porém, havia me internado em qualquer delas para observá-las de perto. A rua que transitei tinha a largura de veículo de tamanho médio, com calçadas esburacadas. Carros velhos, caminhonetes, bicicletas, motocicletas estacionavam de ambos os lados. Moradores circulavam ou se sentavam à porta dos cortiços, jogando dominó, baralho ou conversa fora. Mesinhas exibiam copos de cerveja e copinhos de cachaça. Assustadora quantidade de crianças, nas barrigas das mães ou que mal haviam aprendido a caminhar, revelavam alta taxa de natalidade. Cães vadios perambulavam em busca de comida, nos montes de lixo acumulados.
Percebi estar entre pessoas comuns e recuperei a calma. No meio da comunidade avistei um carro de autoescola, dois taxis, igreja evangélica e farmácia. Passei a me sentir em casa. O que oferecemos a crianças e adolescentes faveladas? Nada. Absolutamente nada. Conseguirão, um dia, encontrar trabalho decente ou engrossarão as fileiras de subempregados e desempregados? Quando a falta de trabalho é a tragédia dos nossos tempos, que destino aguarda analfabetos, semialfabetizados, profissionalmente desqualificados? Como responderão às necessidades da economia informatizada e globalizada? A legislação trabalhista é excludente de menores e idosos. Exigências insensatas empurram jovens acima de 14 anos à ociosidade. Notícias diárias de jornais, rádios e televisões, mostram que a muitos não se apresentaram alternativas além do crime.
O problema da favela é municipal. Estado e União devem ajudar na busca de soluções, mas medidas imediatas e objetivas, como moradia, educação, transporte, emprego, segurança, dependem de enérgica e pronta intervenção dos poderes municipais. A esperada e jamais concretizada reforma trabalhista deveria contemplar a questão do favelado, cuja família necessita que encontre emprego, mas não o consegue por barreiras legais asnáticas.
“Brasil, terra de contrastes….Contrastes geográficos, contrastes econômicos, contrastes sociais”, escreveu Roger Bastide no prefácio do livro traduzido por Maria Isaura Pereira de Queiroz, editado em 1959 pela Difusão Européia do Livro. Vivesse Roger Bastide e visitasse Rio de Janeiro, São Paulo, Recife, Brasília, Belém, Rio Branco, Manaus, Porto Alegre, diria que o Brasil de hoje ficou pior do que o Brasil do passado..