As bolinhas de gude e Ângelo Angelim

Corria o ano de 1956. A rua Padre Fabiano ainda não havia sido pavimentada com paralelepípedos. Quando isto ocorreu, pouco durou. Já na década de 60 chegou o asfalto, retirando-os, todos. Era terra batida e nas sarjetas os montes de lenhas para os fogões das casas.
De quando em vez lá vinha o “Braz”, com o seu capote cinza, seu vistoso cavalo e os cães, levando os bois para o “Matadouro”.
Era uma correria total, com as portas fechadas e apenas olhavam-se pelas janelas aquela gritaria e latidos, acossando o animal para até quase o final da rua. De lá, apanhava-se a rua Tiradentes e se seguia para o referido “Matadouro Municipal”.
Parávamos o jogo de bolinhas nas calçadas e, pelo assovio, recolhíamos dentro de nossas casas, ainda com o “picuá” à tiracolo.
Isto acontecia com muita frequência, logo após o almoço. De manhã, estávamos no Augusto Castanho.
Jogo de bolinhas de gude era para a nossa faixa etária. Os mais velhos só ficavam vendo quem ganharia as tais bolinhas dispostas num triângulo riscado na calçada. Coisas de crianças. E quanto dessas vezes víamos pessoas dali, interessadas no jogo e na diversão da petizada.
Entre estes mais velhos, um moço dos seus 21 anos que, com um ar mais de sacerdote, voz macia, pensativo, amável, parava, olhava, sorria e seguia o seu caminho até o comércio do seu pai, na rua Padre Haroldo (“Casa Angelim”). Seu nome: Ângelo Angelim.
Depois, esta figura sumiu de Capivari. Fez três cursos superiores na USP: administração, letras e filosofia pura. Foi professor, administrador e político. Aliás, foi governador de Rondônia, na época da transformação de território em estado. Figura de realce e empresário dos mais dedicados no ramo de madeireira – tão próprio, na época, na região. Figura cativante.
Era filho de Salvador Angelim e de Dona Ana Capriolli e havia nascido em 21 de janeiro de 1935. Casou com Elisabeth Maria Ansiliero e teve dois filhos.
Em 1977, com 42 anos de idade, transferiu-se residência para Vilhena, Rondônia, onde criou as suas novas raízes, mas nunca deixou de amar a sua terra natal, Capivari.
Com 82 anos de idade, foi internado no Hospital Santa Rosa, em Cuiabá, Mato Grosso, onde veio a falecer recentemente, no dia 3 de julho passado.
Lembramos, nitidamente, da sua pessoa. Mas isto já faz muitos anos e a nossa memória registra, ainda, o seu sorriso, a sua cortesia e o seu entusiasmo pela vida.
Pediu, ele, em derradeiros dias, que seu corpo viesse para Capivari, sua terra natal, em jazigo perpétuo. E que o seu caixão fosse coberto pela Bandeira de Rondônia – terra que lhe adotou e lhe deu projeção. Foi cumprido o pedido.
As bolinhas de gude, de há muito já não mais rodopiam nas calçadas da Padre Fabiano e seu filho Ângelo Angelim se foi de entre nós.